segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Carl G. Jung – O problema do mal no nosso tempo

Seguindo a idéia dos posts anteriores, tanto sobre aquele sobre a culpa coletiva e sobre não entender como as pessoas são capazes de cometer certos crimes quanto o imediatamente anterior, no qual Marie-Louise Franz fala sobre o problema do mal e voltar para si mesmo, esse trecho do artigo O problema do mal no nosso tempo, de Carl Gustav Jung, aborda ambos os assuntos e dá uma iluminada nas idéias abordadas nos textos passados:

"A pessoa que deseja ter uma resposta para o problema do mal, conforme ele se apresenta hoje, necessita, em primeiro lugar, de autoconhecimento, ou seja, do conhecimento mais absoluto possível da sua própria totalidade. Precisa saber a fundo quanto bem pode fazer e de quantos crimes é capaz, e deve evitar encarar um como real e o outro como ilusório. Ambos são elementos da sua natureza e ambos estão destinados a vir à luz nele, se ele desejar — como deveria — viver sem enganar ou iludir a si mesmo. 
Mas, em geral, a maioria das pessoas está por demais distanciada desse nível de consciência; se bem que muitas pessoas hoje em dia possuem em si mesmas a capacidade para uma percepção mais profunda. Esse autoconhecimento é da maior importância, pois através dele nos aproximamos daquele estrato fundamental, ou âmago, da natureza humana onde se situam os instintos. Nessa camada profunda, estão aqueles fatores dinâmicos que existem a priori e que, em última análise, governam as decisões éticas da nossa consciência. Eles compõem o inconsciente e seus conteúdos, a respeito do qual não conseguimos emitir nenhum julgamento definitivo. Nossas idéias sobre o inconsciente estão fadadas a ser inadequadas, pois somos incapazes de compreender cognitivamente sua essência e estabelecer limites racionais para ele. Só podemos alcançar o conhecimento da natureza através de uma ciência que amplie a consciência; logo, o autoconhecimento aprofundado também exige ciência, isto é, psicologia. Ninguém constrói um telescópio ou microscópio com um estalar de dedos e boa vontade, sem conhecimento da óptica. 
Atualmente precisamos da psicologia por razões que envolvem a nossa própria existência. Ficamos perplexos e aturdidos ante o fenômeno do nazismo ou do bolchevismo porque nada sabemos sobre o homem ou porque dele fazemos apenas uma imagem distorcida e desfocada. Se tivéssemos um certo conhecimento de nós mesmos, o caso seria diferente. Estamos face a face com a terrível questão do mal e nem sequer sabemos o que está diante de nós, muito menos que resposta lançar contra ele. E, mesmo se soubéssemos, ainda assim não compreenderíamos "como as coisas chegaram a esse ponto". Demonstrando gloriosa ingenuidade, um estadista recentemente vangloriou-se de não possuir "imaginação para o mal". Muito certo: nós não possuímos imaginação para o mal, mas o mal nos tem em suas mãos. Alguns não querem saber sobre o mal e outros estão identificados com ele. Essa é a situação psicológica do mundo nos nossos dias: alguns se denominam cristãos e imaginam poder, por um simples ato de vontade, calcar o suposto mal sob seus pés; outros sucumbiram ao mal e não vêem mais o bem. O mal, hoje, tornou-se uma Grande Potência".

ZWEIG, Connie; ABRAMS, Jeremiah (orgs.). Ao Encontro da Sombra. O Potencial Oculto do Lado Escuro da Natureza Humana. São Paulo: Editora Cultrix, 2004

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